quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Milena Rebouças: “O Hospital de Base é superlotado porque não nega atendimento”


 
“Realmente é um grande desafio, mas a gente assume com muito otimismo e expectativa por acreditar no SUS”
 
A diretora do Hospital Regional de Vitória da Conquista, Milena Rebouças Andrade, sabe o peso da responsabilidade que é administrar uma unidade de saúde que atende pacientes de mais de cem municípios e que, não obstante dê conta do recado, é pauta permanente em jornais, rádios e blogs, em geral pelas ocorrências consideradas negativas, quase nunca pelo grande número de atendimentos bem-sucedidos ali verificados. Enfermeira formada há 12 anos pela Universidade Estadual de Feira de Santa/UESF, sanitarista especialista em saúde pública, especialista em Gerontologia e UTI e na área pedagógica de saúde. Mas antes de tudo, ela é uma otimista que acredita no Sistema Único de Saúde/SUS e busca criar as condições para que o Hospital de Base alcance níveis de excelência equiparados à rede privada. Em entrevista ao Blog do Fábio Sena, Milena fala dos desafios, das perspectivas e de todos os avanços e vitórias obtidas no hospital nos últimos anos.


BLOG DO FÁBIO SENA: O que significa administrar um hospital como o HGVC, o que é que isso encerra, quais são os grandes desafios?
 
MILENA ANDRADE: Realmente é um grande desafio, mas a gente assume com muito otimismo e expectativa por acreditar no SUS e querer fazer a cada dia um sistema de atendimento aos usuários, aos cidadãos, com mais excelência, com mais qualidade. E eu acredito nisso e acho que é possível e a cada dia a gente busca fazer isso acontecer pela moralidade no sistema, trazer o profissional de saúde à reflexão, mostrar a importância dele para o sistema de saúde, trazendo o usuário também para próximo para que ele entenda o que é o SUS, a resolutividade que o SUS tem, a quantidade de atendimento que o SUS oferece e que até em planos de saúde a gente tem dificuldades. Então, por exemplo, a gente tem aqui uma UTI Pediátrica no HGVC que o município de Vitória da Conquista não tem na rede privada, da região a única UTI pediátrica é a da HGVC. Não é raro a gente ter transferência de pessoas da rede particular, de convênios, para o HGVC, porque não tem na rede privada, inclusive solicitação de transferência para outros Estados. Fora isso, as cirurgias de alta complexidade que são realizadas aqui hoje, que antes tinha que transferir o paciente para fora, para Salvador, São Paulo, hoje são realizados aqui no HGVC. Cirurgias de neuro, oncologia, somos referência hoje também em oncologia, o tratamento de usuário fica muito mais fácil acesso, pois são oferecidos aqui mesmo na cidade. Então, são muitas vantagens que o SUS oferece dentro do território de Conquista de acordo com a implantação de novos serviços. A gente teve recentemente a implantação do novo serviço do Centro de Hemorragia Digestiva (CDH), o único do interior da Bahia pelo SUS que hoje tem paciente com hipertensão portal que antes eram atendidos todos por Salvador e hoje serão atendidos por aqui. Outros procedimentos de alta complexidade como CPRE que eram todos transferidos para Salvador e estão sendo realizados aqui no hospital de Base. Então, são avanços que vêm melhorar o atendimento a saúde do cidadão de Conquista e da região porque o hospital não atende somente o município de Vitória da Conquista mas toda região; em média, a gente atende cem municípios, embora pela pactuação devessem ser apenas 76 municípios, mas como nós somos hospital do SUS, porta aberta, a gente atende em media 100 municípios por ano, inclusive Norte de Minas Gerais.
 
BLG: Milena, administrativamente, ainda falando dos desafios, quais são os desafios de ordem interna que uma diretora enfrenta e que tem que estar saneado diariamente? Aquelas de ordem burocrática, de ordem de atendimento. Quais são os desafios mais presentes?
 
MILENA REBOUÇAS: Para que o serviço público funcione, tem uma legislação que a gente tem que seguir. Então, para adquirir qualquer equipamento, qualquer material, qualquer obra a ser realizada, a gente precisa passar pelo processo de licitação e toda a legislação que rege o processo licitatório tem várias etapas e isso, às vezes, aos olhos das pessoas, da sociedade, não dá para entender porque são etapas burocráticas e tem uma certa morosidade nesse processo.
 
BLG: Qual é o prazo?
 
MR: Tem um prazo próprio que a legislação coloca. Então, a gente já está com a reforma da unidade que é um problema, uma unidade com 18 anos que nunca passou por reforma nenhuma, e já tem problemas na estrutura e precisa ser reformada, inclusive a reforma geral da unidade já tinha sido licitada e por problemas anteriores na licitação a gente teve que cancelar o processo e agora, no dia 22 desse semana, quinta-feira, já está marcada nova licitação da reforma geral da unidade. A gente está com bastante expectativa de que tudo dê certo agora para que a gente realmente veja a reforma acontecendo. Com essa reforma a gente vai ter a implantação da UTI Neonatal, além da reforma de toda a unidade. Já está acontecendo por licitação a reforma da parte elétrica, portanto, toda parte elétrica do hospital já está sendo reformada. E com a reforma da parte elétrica a gente conseguir ampliar dois leitos na UTI Adulto.
BLG: Uma reclamação, talvez até por falta de leitos no hospital, é o número de pessoas nos corredores; o quê que causa isso e quais as medidas possíveis para resolver isso?
 
MR: A superlotação do hospital é decorrência de ser porta aberta e atender todo mundo. Hoje, a gente tem um problema que já foi até sinalizado ao Ministério Público e já está sendo providenciada uma reunião com os secretários e gestores dos municípios, porque tudo vem para o município, para o HGVC, situações que outros hospitais da região poderiam estar resolvendo vêm para o Hospital de Base. Então, isso superlota o hospital. Ele é superlotado porque não nega atendimento, basicamente por isso. Agora a gente tem déficit de leitos na cidade, inclusive na rede privada; para resolver esse problema da falta de leitos já foi providenciada a transformação, já esta em fase de processo de reorganização do Hospital Afrânio Peixoto em Hospital Geral, onde a gente vai ter de retaguarda para o HGVC 50 leitos de clinica médica, além dos leitos de Psiquiatria e dependência química. Então, este hospital vai ser destinado a este público, com esses 50 leitos de clinica médica a gente vai conseguir dar uma retaguarda importante para o atendimento à população, porque a gente vai conseguir ampliar expressivamente a quantidades de leitos que vão estar disponíveis para a população. Fora isso, o secretário de saúde do estado, que lançou a proposta de convênio com os hospitais de cidade, da rede privada, filantrópica, para convênio de leitos do SUS para esses hospitais. Já está com a proposta de cirurgia de ortopedia, neurocirurgia em outros hospitais para dar celeridade ao processo de atendimento aos pacientes. Estamos aguardando a concretização dessa proposta do Estado com os hospitais.
 
BLG: Ainda em relação a esta superlotação, se os municípios investissem um pouco mais na sua saúde você acha que reduziria essa procura pelo HGVC?
 
MR: Com certeza. Como eu te falei, vÁrias situações poderiam ser resolvidas nos municípios de origem e são todos transferidos para cá. A gente tem um termo utilizado que as pessoas fazem ambulancioterapia, transfere o paciente, colocam numa ambulância e transferem o paciente para o município de Vitória da Conquista para que o município aqui resolva a situação do paciente, sendo que muitos municípios poderiam ter sua rede organizada para que pudessem atender seu munícipes lá mesmo, evitando esse transtorno.
 
BLG: Quais são os casos que você diria serem esdrúxulos de uma pessoa que teria todas as condições de ser atendida lá e que é mandada para o hospital?
 
MR: Por exemplo, o município de Brumado tem um hospital e a gente recebe constantemente apendicite que é uma cirurgia, uma situação comum, e quase todas são transferidas para Vitória da Conquista.
 
BLG: E por que não faz lá?
 
MR: Aí eu não sei te dizer realmente porque é que não faz lá, se é a falta de compromisso, se as pessoas não querem trabalhar e transfere o problema. Mas são situações de municípios que tem o serviço e os pacientes são transferidos para cá. Tem também a questão do próprio paciente dizer que mora aqui por conta própria, vir para Conquista e dizer que não está conseguindo atendimento lá, apesar do município lá oferecer o tratamento ele não consegue ser atendido e ele vem para Vitória da Conquista por conta própria e muitas vezes dizendo que é morador de Vitória da Conquista e a gente tem as casas aqui financiadas pelas próprias prefeituras para alojar as pessoas e dizerem que são moradoras daqui. Isso é um problema que existe em VItória da Conquista, que o município está tentando resolver com a implantação do Cartão SUS, com a vigência do Cartão SUS, mas mesmo assim a gente enfrenta esse problema e no HGVC a maioria das pessoas já entra dizendo que é moradora de Vitória da Conquista; quando está aqui dentro a gente começa ver a problemática surgir porque um diz “ah! não posso ter acompanhante aqui porque eu mora lá em tal lugar”, aí você descobre que o paciente não é de Vitória da Conquista.
 
BLG: Qual o percentual de fora?
 
MR: Nas estatísticas você vai ter que 80% é de Vitória da Conquista, porque todos dizer ser de Vitória da Conquista, mas quem está aqui dentro, os profissionais relatam pra gente que a estatística que faz internamente é que 50% dos pacientes são de fora.
 
BLG: Ou seja, existe a cultura que as pessoas têm de imediatamente procurarem o HGVC para qualquer coisa, mesmo quando ela poderia procurar o posto de saúde?
 
MR: Exatamente. A gente tem a estatística aqui que demostra que, tem até mudado um pouco, mas até final do ano passado a gente tinha 60% da demanda atendida na emergência era de nível ambulatorial. Não era pra ser atendida no HGVC. Mas como o trabalho do Acolhimento, Classificação e Risco, as pessoas estão começando a entender que o hospital é um hospital de emergência e quem tem prioridade de emergência é o paciente que realmente tem sua vida em situação de risco iminente de morte, é o paciente de urgência e emergência que tem prioridade e então esse paciente que procura, que poderia ser atendido numa unidade básica de saúde a onde o atendimento é a nível ambulatorial e ele fica muito tempo esperando atendimento, então eles estão começando a entender que o hospital não tem esta finalidade. Não é o melhor momento. É uma cultura pra ser vencida. A gente tem trabalhado com essa questão, o hospital tem que ser referencia de urgência e emergência, nós somos o hospital que temos condições de atender um trauma e o único hospital pelo SUS que tem condições de atender, que tem uma equipe de neurocirurgia de plantão 24 horas, então essas situações é que tem que vir para o hospital de base, porque só nós é que vamos ter resolutividade. Então os traumas, os acidentes de moto, as agressões, vitimas de acidentes, esses pacientes todos vêm para o hospital de base, muitas vezes a gente está superlotados com situações que poderiam não estar sendo atendido aqui e isso superlota o hospital.
 
BLG: Milena, uma questão básica do sistema de saúde é o atendimento, aquele atendimento inicial; existe um trabalho de qualificação do pessoal para que este atendimento se dê em outro nível, diferentemente do que se entendeu por ser atendimento do SUS?
 
MR: A gente tem investido nisso, na humanização do atendimento. A gente já fez oficinas de motivação, de humanização com os servidores de atendimento do hospital que está na porta de entrada, pessoal de registro de internamento, recepção para que essas pessoas se coloquem no lugar do cidadão que procura o hospital, como ele gostaria de ser atendido. Sem colocar a questão a gente fez oficinas que a gente trabalhou sobre estas questões, ouvimos as dificuldades do trabalhador também, que muitas vezes a gente cobra, cobra e cobra, mas a gente não ouve o que o servidor está tendo ali de dificuldades para que a gestão possa investir e melhorar a condição de trabalho dele e ele se sinta bem para atender o outro; tem sido uma prioridade do governo, da gestão do hospital, que a gente invista nestas questões pra que a gente dê um melhor atendimento ao usuário. A outra questão é o próprio acolhimento com classificação de risco que um dos dispositivos da humanização da saúde pelo Ministério da Saúde, que foi implantado desde setembro do ano passado e com essa implantação o objetivo é que a gente escute a demanda do usuário e priorize quem tem mais necessidade de atendimento, atendendo ao critério da equidade do SUS.

3 comentários:

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    1. NAO GOSTEI DESSA PESSOA COMO ADMINISTRADORA UM HOSPITAL DE RENOME COMO O HGVC...............
      QUEM NAO TEVE COMPETÊNCIA PARA ADMINISTRAR UM CURSO TECNICO,,,PODE ADMINISTRAR UM HOSPITAL DE PORTE???????????

      ABRAM O OLHO..

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  2. Pois Carlos Alberto, pra sua decpeção, Milena tem feito um ótimo trabalho e reconhecido por todos.

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