Artemia salina, crustáceo cujos ovos resistem a ambientes extremamente secos, fará parte do experimento para "ETs"
Um novo laboratório a ser construído em Valinhos, no interior paulista, será o primeiro do país a testar indivíduos para verificar se são capazes de suportar viagens espaciais. O segundo astronauta brasileiro, porém, não será um humano, e sim um microrganismo.
Como ainda não foi encontrado nenhum planeta similar à Terra no Universo, o que o novo projeto tentará descobrir é quais organismos poderiam viver em luas e planetas já conhecidos. Um dos idealizadores do laboratório é Eduardo Janot Pacheco, professor do Instituto Astronômico e Geofísico da USP.
Segundo ele, a ideia é construir uma câmara de simulação de ambientes extremos para avaliar a vulnerabilidade de alguns seres vivos a altas temperaturas, radiação e situações às quais a maioria dos organismos não sobrevive.
O dinheiro para o projeto, em tese, já existe. Deverá sair do Inespaço, um dos novos INCTs (Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia) criados pelo governo federal, que possui verba prevista de R$ 7 milhões para um período de três anos. Valinhos foi escolhida porque a USP já mantém um observatório lá. O novo laboratório deve aproveitar a infraestrutura.
Mas os cientistas não precisam esperar a nova câmara para trabalhar. Janot apresenta nesta semana, na Assembleia Geral da IAU (União Astronômica Internacional), no Rio, uma pré-seleção dos candidatos à "panspermia", o espalhamento da vida pelo Universo.
Ao extremo
Junto com os biofísicos Ivan Paulino Lima e Cláudia Lage, da UFRJ, ele identificou diversos extremófilos --micróbios resistentes a condições extremas-- que seriam capazes de viver fora da Terra.
O que o trio fez foi cruzar dados de inúmeros trabalhos de astronomia e de biologia. Após Janot determinar as estimativas da temperatura média de diversos planetas já conhecidos fora do Sistema Solar (os exoplanetas), os pesquisadores listaram quais deles poderiam abrigar micróbios como a Pyrolobus fumarii, que vive em fendais termais no oceano, suportando até 130ºC.
"Não é só que eles sobrevivem a essas condições extremas. Eles gostam de viver assim", diz Janot, que diz querer redefinir aquilo que os astrônomos chamam de "zona habitável". Hoje, essa é a classificação das zonas orbitais que não estão nem tão perto nem tão longe de seus sóis e são capazes de abrigar a água líquida.
"Aqui, a água é o solvente onde as reações necessárias à vida acontecem", explica Janot, alertando, porém, que talvez isso não seja uma regra geral. Afinal, existem micróbios capazes de resistir a uma vasta gama de condições inóspitas.
"Já que esses extremófilos sobreviveriam fora da zona habitável clássica, proponho que consideremos importantes também os planetas e luas que estejam na zona habitável desses organismos", diz Janot. Alguns exoplanetas com tamanho similar ao de Netuno têm temperaturas mínimas de 120ºC, viáveis para certos extremófilos terrestres.
RAFAEL GARCIA
enviado especial da Folha de S.Paulo ao Rio
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